28 outubro 2008

A propósito disto aqui

Carta enviada (por via electrónica) ao Sindicato de Jornalistas:

Exmos. senhores:

Vêm de há algum tempo as minhas interrogações sobre a real vantagem de ser, hoje, sindicalizado. Na minha opinião (que vale apenas enquanto tal, naturalmente), o SJ padece do mal geral do sindicalismo, pelo menos em Portugal - pouca adequação aos tempos modernos e dificuldades tremendas na leitura e adaptação ao que é, actualmente, o mundo laboral.

A recomendação do Conselho Deontológico (CD) de 24 de Outubro, a propósito da alegada «linguagem violenta utilizada no noticiário desportivo», fez-me pensar precisamente em tempos antigos, que não vivi mas dos quais tenho conhecimento. Os tempos em que os jornalistas «desportivos» não podiam ser sindicalizados.

O estigma que paira sobre a informação desportiva continua vivo. Isso sim, já tenho sentido na pele. Apenas da parte de companheiros de profissão, felizmente, já que no que respeita ao público que nos lê, ouve e vê os números vão falando por si.

O facto de o CD referir, no documento, a possibilidade de «cair na denominação de jornalismo menor» revela todo o preconceito que subsiste. Isto para não falar do conceito de «jornalista desportivo». Desconheço a denominação, ignoro a tipologia que separa jornalistas por classes ou assuntos. Ou também há recomendações a «jornalistas políticos», «jornalistas económicos», «jornalistas sociais» ou «jornalistas hortícolas»? Ou mesmo a «jornalistas sindicais», que no caso desta recomendação esquecem o óbvio dever de citar as fontes donde emanam as queixas que a motivaram, deixando o manto da suspeição cair sobre todos os jornais do país, visto que nenhum abdica de generosas fatias das suas edições para dedicar à informação desportiva?

Sindicalizei-me assim que me iniciei na profissão, como estagiário, há 14 anos. Sempre que discuti a filiação com outros jornalistas da minha geração (não filiados em maioria), descobri que o meu único argumento para continuar era uma questão política e ideológica. Esta «recomendação» atinge-me enquanto profissional. Como a política e a ideologia não se praticam nem defendem através do pagamento de quotas mensais - nem, quanto a mim, através de metodologias, preconceitos e formas de luta ao estilo dos anos 70 e 80 - entendo desfiliar-me do Sindicato a partir desta data.

Com os melhores cumprimentos

5 comentários:

Rita disse...

Olha, eu também já mandei para lá um mailzinho. Embora já me tenha desfiliado há muito... Fica aqui a missiva:

Não sou sindicalizada e se alguma vez se me coloca a questão sobre se deveria sê-lo, comunicados como este do Sindicato dos Jornalistas tiram-me qualquer dúvida. Obviamente que não quero pertencer a uma organização que emite opiniões desta natureza. Para começar por uma ponta - visto que são tantas - o termo «jornalistas desportivos», essas criaturas que são tão consideradas ou tão pouco que têm direito a categoria própria, distinta dos outros todos, os jornalistas na verdadeira acepção do termo. Eu trabalho na área do desporto mas considero-me jornalista de corpo inteiro. Não falo só de bola nem de tacos de hóquei, muito menos escrevo ou sonorizo textos que contenham linguagem que considero menos apropriada.
Pegar, como V. Exas. fazem, num texto de «um jornalista» sobre a cobertura de um evento de índole local - já agora era interessante que indicassem o texto, o autor e o órgão de comunicação social em que foi publicado - e daí extrapolar e dar puxões de orelhas à escola primária aos «jornalistas desportivos» é no mínimo de quem se preocupa pouco com o que é importante e decide antes dar importância ao acessório.
A comunicação social portuguesa está cheia de maus e bons textos, maus e bons profissionais, más e boas escolhas de linguagem. Se por cada vez que a cobertura de um evento menos bem feita der direito a um comunicado destes V. Exas não terão mais nada com que se preocupar, mas aí louvar-vos-ei os esforço e a dedicação.
Contudo, o que mais me choca é a seguinte afirmação de V. Exas. : «...o Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas (CD) recomenda os jornalistas desportivos a "relatar os factos com rigor e exactidão e interpretá-los com honestidade». Ora aqui está a frase reveladora. Parece escrita pelo tão conhecido «treinador de bancada», compagnon de route do não menos famoso «jornalista desportivo». É aquele que aproveita o mínimo deslize, a mínima falha para apontar todo e qualquer defeito, para dar a bofetada que faltava, para pôr definitivamente na ordem estes meninos mal comportados que fazem jornalismo de segunda categoria, que são pouco rigorosos e desonestos.
Creio que não é isto que se espera dos nossos pares. A não ser que não sejamos considerados como tais. Da minha parte, continuo firme na minha convicção de não ser sindicalizada num órgão que não me representa de todo.

Os melhores cumprimentos,
Rita Ferreira

bf disse...

Eu fi-lo há muito tempo!
Mas mais vale tarde do que nunca!

bf disse...

adoro estes emails.
40 meses depois terás de mandar um como este:

Exmos senhores,

Foi com alguma surpresa que recebi hoje uma carta a informar-me de que devo 40 meses de quotas do Sindicato dos Jornalistas.

Acontece que há sensivelmente 40 meses eu enviei um email para os serviços a comunicar que nesse preciso momento deixava de ser sócio e nesse mesmo instante comuniquei ao departamento de R.H. do 24horas (onde trabalhava) que não queria que fossem efectuados mais pagamentos ao Sindicato.

Aparentemente, o Sindicato não levou a sério o meu e-mail, tendo hoje o meu nome numa lista de "devedores" que não o são.

Considerando a confusão esclarecida, despeço-me com os melhores cumprimentos.

Jo disse...

na xafarica onde trabalho ignorámos ostensivamente essa belo recomendação...
não mereceu nem uma letra, quanto mais uma linha :P

Ana Clara disse...

Há muitos anos que o Sindicato apenas existe no PAPEL. Na hora de cumprir a função que lhe cabe assobia para o lado.
Pior: finge resolver os problemas através de comunicados ocos, vazios e sem conteúdo.
Seria bom que os jornalistas sindicalizados tomassem cada vez mais consciência de que confiam numa «instituição» que não os defende nem representa.
São inúmeros os exemplos de como a apatia reina por ali há anos.
Mas o problema persistirá se nós, profissionais, nada fizermos. Se continuarmos a jogar o mesmo jogo sindical.
Era pelo menos oportuno e útil — ainda que não se chegasse a um consenso — discutir as vantagens e desvantagens de uma Ordem de Jornalistas. Nunca entendi a razão pela qual a Classe sempre teve medo disso. Passar de sindicalismo a corporativismo não será, decerto, melhor. Mas não custa tentar o modelo.